O PRINCÍPIO DO ASSINCRONISMO REVISITADO: UM MODELO SEMIÓTICO DE DISPOSITIVO AUDIOVISUAL

Como um dispositivo audiovisual gera sentido(s) a partir das complexas articulações técnicas e estéticas que é capaz de estabelecer entre as imagens, os sons e o discurso (oral ou escrito)? Em que consiste o componente gerativo do sentido de um filme, por exemplo, e como descrevê-lo em termos semióticos? O componente gerativo audiovisual do cinema não pode ser considerado como a simples oposição binária, convergente ou divergente, das imagens aos sons ou de uma seqüência visual a uma trilha sonora. Trata-se de uma relação duplamente articulada que engaja tanto o campo do visível quanto o campo do audível na disjunção entre um plano de conteúdo e um plano de expressão (ouvir/escutar, ver/olhar). O modo como estes dois planos são articulados é fundamental, pois não se pode simplesmente atribuir a função expressiva a um campo e o papel de conteúdo a outro. A dicotomia entre o plano de conteúdo e o plano de expressão, assim como a disjunção entre o signo e seu objeto ou o significado e o referente, atravessa tanto o campo do visível como o campo do audível. Na medida em que ambos pressupõem, por inversão, a invisibilidade do olhar e a opacidade do som como o avesso do(s) seu(s) sentido(s), pode-se conceber o componente gerativo audiovisual do cinema como um quadrado semiótico em que o plano ou eixo do conteúdo (audiovisual) se constitui pela articulação do par sêmico escuta-olhar, enquanto o plano ou eixo da expressão (material) se articula através do par sêmico imagem-som. Objeto-som e olhar-objeto são as resultantes da redução, no sentido fenomenológico do termo, do componente gerativo do cinema à sua dupla articulação audiovisual. O olhar, considerado como objeto, é o avesso da imagem entendida como signo, assim como a percepção do som como objeto é o avesso da escuta entendida como a compreensão do sentido dos sons. Uma mesma relação disjuntiva ao signo articula, portanto, o olhar à escuta, através do ver e do ouvir. Esta relação disjuntiva pode ser chamada de princípio do assincronismo, pois consagra a disjunção isomórfica do plano de expressão ao plano de conteúdo (imagem/olhar:escuta/som). É o princípio de assincronismo que trilha as linhas de sutura ou cesura, de solda ou de fratura que percorrem as diversas camadas de imagem e som de que se compõe o filme, de modo a conjugá-las e/ou “disjuntá-las”, de acordo com a necessidade e/ou contingência. O princípio do assincronismo é o princípio de composição dos dispositivos audiovisuais como o cinema (seu componente gerativo), pois permite pensar a correlação entre dois processos assimétricos, a dupla articulação de um plano material de expressão a um plano audiovisual de conteúdo. Não se trata apenas do princípio técnico de sincronização dos sons às imagens, tampouco da sincrese como princípio estético de composição audiovisual, mas de ambos em sua correlação disjunta, e da indecidibilidade estrutural que extrai, da imperceptível diferença geradora de semelhanças, o simulacro entendido como intervalo ou oscilação entre o objeto e seu duplo.
País: 
Brasil
Temas y ejes de trabajo: 
Los pasajes y articulaciones entre semióticas verbales y no verbales
Semióticas de los lenguajes visuales, sonoros y audiovisuales
Institución: 
Escola de Comunicação e Programa de Pos-Graduação em Ciencia da Informação da Universidade Federal do Rio de Janeiro - ECO-PPGCI/UFRJ
Mail: 
ivan.capeller@eco.ufrj.br

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